A arte-grito de revolta

da artista visual Usha Velasco em seu trabalho “Doente de Brasil” 

Em Tempos de 
“Bolsonarismo como anti-mundo ou projeto distópico de institucionalização do absurdo”

Usha Velasco
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Priscylla Joca
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Luciana Nóbrega 
Lattes


Por Priscylla Joca e Luciana Nóbrega: 

O trabalho da artista Usha Velasco nos tocou bastante, levando-nos a escritura de um artigo baseado em resultados parciais de uma pesquisa que temos desenvolvido, de modo independente, desde 2020. Temos investigado sobre desmontes e processos de institucionalização de políticas estabelecidas no atual governo federal, com foco em direitos socioambientais. Esta pesquisa tem nos levado a compreender o bolsonarismo como programa-prática político-jurídico que tem se entranhado em vários níveis institucionais do Estado brasileiro. 

O texto “O bolsonarismo como anti-mundo ou projeto distópico de institucionalização do absurdo” é, pois, também fruto das inquietações provocadas pelas fotos-colagens com frases de pessoas diversas produzidas por Usha Velasco em seu trabalho “Doente de Brasil”. Esse artigo foi publicado inicialmente na Coluna Direitos e Movimentos Sociais, no Jornal Brasil de Fato, em 15 de abril de 2021, trazendo reflexões e exemplos de como o bolsonarismo tem instituído discursos e práticas do absurdo baseados em diversas reportagens e artigos de outras pesquisadoras e pesquisadores.

Ficamos ainda mais instigadas a seguir em nossas pesquisas e escrituras ao receber a permissão de Usha Velasco para divulgar o texto junto com suas fotos-colagens. Como mulheres, sabemos o quanto rebeldias compartilhadas constituem resistências transformadoras! Para que Usha possa seguir inspirando em todas nós a rebeldia que nos impele a seguir coletivamente resistindo ao bolsonarismo, compartilhamos com vocês as inspiradoras palavras da artista sobre sua obra. 

Por Usha Velasco: 

Esta série fala sobre o espanto, o desamparo e a revolta das pessoas diante da realidade que vivemos hoje, em meio à pandemia e à necropolítica em curso no país. Ela nasceu e foi construída por falas de diferentes pessoas, colhidas nas redes sociais entre janeiro e abril deste ano. Divide-se em duas partes, a primeira com fundo colorido, a segunda quase totalmente em preto. Ambas trazem a bandeira nacional, fotografada em locais públicos. 

O trabalho partiu da ideia de coletividade, e é por ela permeado. São bandeiras pintadas em lugares diversos, por pessoas diversas, acompanhadas por falas de outras diversas pessoas. Trata-se de falas de gente em sofrimento, cada um à sua maneira, mas com uma preocupação em comum (com o coletivo) e um sentimento em comum (a empatia). 

As fotos foram feitas entre 2003 e 2011, no contexto de um governo de centro-esquerda e de esperança em um país melhor. Sobre elas colei frases de 2021, num contexto totalmente oposto. A primeira parte traz frases mais íntimas, desabafos, quase que gritos de socorro. A segunda traz frases mais objetivas e contundentes sobre a realidade atual.

A forte presença da bandeira nas ruas sempre me chamou a atenção; fotografei inúmeras ao longo dos anos. Em comunidades “periféricas”, onde o Estado exige tanto das pessoas e oferece tão pouco em troca, essa presença me parecia tocante, contraditória e triste. 

Com frases atuais sobre imagens de dez anos atrás ou mais, este trabalho traz também um salto temporal que, embora não esteja aparente, imprime certos tons dessa contradição, e remete a um pensamento comum hoje: como é possível estarmos nessa situação? Como chegamos até aqui tão rapidamente?

“Doente de Brasil – ou 2021: o normal acabou”. Série de Usha Velasco. Colagens digitais: fotografia e apropriação de falas colhidas em redes sociais.

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